Quem acessa o ensino superior

 


Duzentos e três milhões de pessoas. Esse é o número de habitantes no Brasil, segundo o Censo Demográfico 2022 do IBGE. Agora, dados recém-divulgados trazem informações detalhadas sobre o acesso à educação dessa população. Entre os 133 milhões de adultos com 25 anos ou mais —dois terços do total—, 18,4% possuem ensino superior completo. Essa proporção é quase três vezes a registrada no Censo de 2000.

Os números recentes revelam uma expansão significativa do ensino superior, mas também evidenciam disparidades persistentes. As diferenças regionais são notáveis: no Centro-Oeste, 21,8% da população com 25 anos ou mais concluiu uma graduação, dado impulsionado pelo Distrito Federal, onde a taxa atinge 37%. As regiões Sudeste e Sul apresentam índices semelhantes ao do Centro-Oeste, enquanto no Norte e no Nordeste a proporção não chega a 15%.

As desigualdades raciais são ainda mais marcantes. Em 2022, apenas 12% da população preta e parda havia concluído o ensino superior —menos da metade do percentual de brancos (25,8%) e muito abaixo da população amarela (44,1%).

A discrepância é ainda maior em determinadas áreas do conhecimento: em medicina, economia e odontologia, três em cada quatro formados são brancos. Já em serviço social e formação de professores, a proporção de brancos cai à metade.

Apesar dessas desigualdades, os avanços são evidentes. Hoje, a proporção de brancos com ensino superior ainda é o dobro da de pretos e pardos, mas, em 2000, essa diferença era de cinco vezes. Foram necessárias duas décadas para que pretos e pardos atingissem o percentual que os brancos tinham no início do século (10%). A ampliação do acesso nesse período decorre de múltiplos fatores, especialmente de políticas públicas que facilitaram a entrada de grupos historicamente excluídos da educação superior, como políticas de cotas, Fies, Sisu e Prouni.

Os números mostram que, no Brasil, nascer branco ou amarelo ainda significa ter mais chances de cursar uma graduação. Ainda há muita desigualdade no acesso, de forma sistêmica. Além do acesso, há desafios na permanência e na conclusão dos cursos. Muitos estudantes abandonam a graduação devido ao desalinhamento com o mercado de trabalho ou dificuldades financeiras. Essas diferenças não são meras preferências individuais, mas reflexo da falta de oportunidades e da baixa qualidade da educação básica.

Ampliar o acesso ao ensino superior, como demonstrado pelo Censo, é um passo importante, mas insuficiente. É preciso discutir, principalmente, a qualidade da educação oferecida. As desigualdades não se restringem ao ensino básico —elas persistem no ensino superior. Um exemplo claro disso são os milhares de formados em direito que não conseguem aprovação no exame da OAB.

A democratização da educação no Brasil avançou, mas ainda há um longo caminho a percorrer. Reduzir desigualdades estruturais exige não apenas ampliar o acesso ao ensino superior mas garantir que todos, independentemente de cor, origem ou condição social, tenham os meios para concluir a formação e usufruir de um ensino de qualidade e de seus benefícios de maneira justa.

Priscilla Bacalhau – Doutora em economia, consultora de impacto social e pesquisadora do FGV EESP CLEAR, que auxilia os governos do Brasil e da África lusófona na agenda de monitoramento e avaliação de políticas.

Disponível em: https://www.geledes.org.br/quem-acessa-o-ensino-superior/. Acesso em 28/02/2025.

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