A mudança
foi oficializada em julho de 2022 com a aprovação da Lei 14.402.
Motivo: A palavra "índio" é considerada problemática por
ser um termo genérico e não considerar a diversidade dos povos indígenas. (Veja mais abaixo.)
Há anos,
defensores das causas indígenas já argumentavam que a data, que marca a luta dos
povos originários pela sobrevivência desde a colonização do Brasil até os
genocídios modernos, deveria ser chamada de "Dia dos
Povos Indígenas".
De
acordo com a professora e doutora em História Social pela Universidade de São
Paulo (USP) Márcia Mura, a alteração era necessária para refletir as
ideias e lutas das diversas sociedades indígenas.
“Índio é um termo
genérico, que não considera as especificidades que existem entre os povos
indígenas, como as especificidades linguísticas, culturais e mesmo a
especificidade de tempo de contato com a sociedade não indígena”.
Segundo Mura, o termo índio reproduz
a visão do colonizador que remete à ideia
eurocêntrica de que os indígenas são atrasados e iguais, desconsiderando as
diferenças linguísticas e culturais.
Em
contrapartida, "indígena" é uma palavra que significa "natural
do lugar em que vive". O termo exprime que cada povo, de
onde quer que seja, é único.
O escritor
indígena, doutor em educação pela Universidade de São Paulo e pós-doutor em
Linguística pela Universidade Federal de São Carlos Daniel Munduruku também acredita
que a palavra "índio" "esconde toda a diversidade dos povos
indígenas".
"A
palavra 'indígena' diz muito mais a nosso respeito do que a palavra 'índio'.
Indígena quer dizer originário, aquele que está ali antes dos outros",
explicou o autor em entrevista à BBC News Brasil.
Munduruku
pertence ao povo indígena de mesmo nome, que está situado em regiões do Pará,
Amazonas e Mato Grosso.
Individualidade dos povos
A
mestra em Linguística Aplicada pela PUC-SP Maria Vitória Berlink defende que o
movimento de adoção ao termo "indígena" é significante porque representa a exposição das individualidades dos povos.
"Os
colonizadores portugueses e espanhóis, principalmente, usavam a palavra 'índio'
para qualquer povo originário que encontravam pelo território. É um termo raso, que não considera qualquer traço individual destes
povos. O que estes mesmos povos tentam fazer agora é tomar para si o
direito de se definirem e de mostrar que são mais do que o termo exprime",
explica.
Para
além da nomenclatura, Márcia Mura ressalta a necessidade de respeitar a
identidade cultural individual de cada povo e tratar as etnias pelo nome.
"Quando
dizemos que não somos índios, queremos dizer que somos Mura, Uruéu-Au-Au,
Guarasugwe, todos habitantes do território Pindorama, que é como os Tupinambá
chamam o que os colonizadores deram o nome de Brasil, mas diferentes".
O
debate sobre como os não indígenas devem se referir aos povos originários
acontece entre os próprios povos, e
a professora diz que há quem se conforme com o uso do termo cravado pelos
espanhóis.
"É preciso lembrar que muitos povos sofreram tentativa de apagamento desde a chegada dos colonizadores. Tentaram apagar nossas línguas, nossas culturas e nossas memórias, e deixaram para nós este termo cheio de estereótipos", lamenta.
Dia
para reivindicar e não comemorar
Apesar da ideia de que o dia 19 de abril é um dia para celebrar
os povos indígenas, Márcia Mura defende que não é de comemoração, mas de
reivindicação.
"Não temos o
que comemorar, porque ainda precisamos reivindicar e pautar nossas lutas.
Lutamos todos os dias pelo nosso território, pela nossa cultura e pelo direito
de viver como vivemos, quando existe uma sociedade que está nos matando pouco a
pouco".
De
janeiro a dezembro de 2022, o acumulado de alertas de desmatamento na Amazônia
Legal foi de 10.267 km², segundo dados do Instituto de Pesquisas Espaciais
(Inpe). Essa foi a pior marca da série
histórica anual do Deter, o sistema de Detecção de Desmatamento em
Tempo Real do instituto.
"Estamos
perdendo nossas terras para estradas, hidrelétricas, termelétricas, pastos e
para a mineração ilegal. Não podemos comemorar enquanto tentamos
sobreviver", diz a professora.
Mas
ela reforça que a floresta não é o único lugar de onde os indígenas resistem.
"Estamos
em diferentes contextos. No interior da floresta, nas margens dos rios e dos
lagos, mas também na cidade, em contexto urbano, além do território demarcado
oficialmente como território indígena".
Márcia
Mura enfatiza o direito de demarcação dos territórios dos povos indígenas. Lembra também que todo território nacional é indígena e
que o cuidado com a terra é de responsabilidade de todos.
“Os
povos cuidam da floresta e dos rios, mas os não indígenas também precisam
cuidar. Eles também vão ser afetados se faltar chuva, se os biomas forem
destruídos. Todos os biomas são importantes e são ligados aos outros. Tudo está
interligado e nós estamos ligados a este ambiente”.
Fonte: https://g1.globo.com/educacao/noticia/2023/04/19/brasil-celebra-1o-dia-dos-povos-indigenas-apos-mudanca-em-lei-entenda-a-diferenca-entre-indio-e-indigena.ghtml. Acesso em 19/04/2023
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