Na
minha primeira diplomação, em 2002, lembrei da ousadia do povo brasileiro em
conceder – para alguém tantas vezes questionado por não ter diploma
universitário – o diploma de presidente da República.Reafirmo hoje que farei
todos os esforços para, juntamente com meu vice Geraldo Alckmin, cumprir o
compromisso que assumi não apenas durante a campanha, mas ao longo de toda uma
vida: fazer do Brasil um país mais desenvolvido e mais justo, com a garantia de
dignidade e qualidade de vida para todos os brasileiros, sobretudo os mais
necessitados.Quero dizer que muito mais que a cerimônia de diplomação de um
presidente eleito, esta é a celebração da democracia.Poucas vezes na história
recente deste país a democracia esteve tão ameaçada.
Poucas
vezes na nossa história a vontade popular foi tão colocada à prova, e teve que
vencer tantos obstáculos para enfim ser ouvida.
A
democracia não nasce por geração espontânea. Ela precisa ser semeada,
cultivada, cuidada com muito carinho por cada um, a cada dia, para que a colheita
seja generosa para todos.
Mas
além de semeada, cultivada e cuidada com muito carinho, a democracia precisa
ser todos os dias defendida daqueles que tentam, a qualquer custo, sujeitá-la a
seus interesses financeiros e ambições de poder.
Felizmente,
não faltou quem a defendesse neste momento tão grave da nossa história.
Além
da sabedoria do povo brasileiro, que escolheu o amor em vez do ódio, a verdade
em vez da mentira e a democracia em vez do arbítrio, quero destacar a coragem
do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral, que enfrentaram
toda sorte de ofensas, ameaças e agressões para fazer valer a soberania do voto
popular.
Essa
não foi uma eleição entre candidatos de partidos políticos com programas
distintos. Foi a disputa entre duas visões de mundo e de governo.
De
um lado, o projeto de reconstrução do país, com ampla participação popular. De
outro lado, um projeto de destruição do país ancorado no poder econômico e numa
indústria de mentiras e calúnias jamais vista ao longo de nossa história.
Ameaçaram
as instituições. Criaram obstáculos de última hora para que eleitores fossem
impedidos de chegar a seus locais de votação. Tentaram comprar o voto dos
eleitores, com falsas promessas e dinheiro farto, desviado do orçamento
público.
Intimidaram
os mais vulneráveis com ameaças de suspensão de benefícios, e os trabalhadores
com o risco de demissão sumária, caso contrariassem os interesses de seus
empregadores.
Quando
se esperava um debate político democrático, a Nação foi envenenada com mentiras
produzidas no submundo das redes sociais.
Eles
semearam a mentira e o ódio, e o país colheu uma violência política que só se
viu nas páginas mais tristes da nossa história.
E
no entanto, a democracia venceu.
O
resultado destas eleições não foi apenas a vitória de um candidato ou de um
partido. Tive o privilégio de ser apoiado por uma frente de 12 partidos no
primeiro turno, aos quais se somaram mais dois na segunda etapa.
Uma
verdadeira frente ampla contra o autoritarismo, que hoje, na transição de
governo, se amplia para outras legendas, e fortalece o protagonismo de
trabalhadores, empresários, artistas, intelectuais, cientistas e lideranças dos
mais diversos e combativos movimentos populares deste país.
Tenho
consciência de que essa frente se formou em torno de um firme compromisso: a
defesa da democracia, que é a origem da minha luta e o destino do Brasil.
Nestas
semanas em que o Gabinete de Transição vem escrutinando a realidade atual do
país, tomamos conhecimento do deliberado processo de desmonte das políticas
públicas e dos instrumentos de desenvolvimento, levado a cabo por um governo de
destruição nacional.
Soma-se
a este legado perverso, que recai principalmente sobre a população mais
necessitada, o ataque sistemático às instituições democráticas.
Mas as ameaças à
democracia que enfrentamos e ainda haveremos de enfrentar não são
características exclusivas de nosso país.
A democracia enfrenta um imenso desafio
ao redor do planeta, talvez maior do que no período da Segunda Guerra Mundial.
Na América Latina, na Europa e nos
Estados Unidos, os inimigos da democracia se organizam e se movimentam. Usam e
abusam dos mecanismos de manipulações e mentiras, disponibilizados por
plataformas digitais que atuam de maneira gananciosa e absolutamente
irresponsável.
A máquina de ataques à democracia não tem
pátria nem fronteiras.
O combate, portanto, precisa se dar nas
trincheiras da governança global, por meio de tecnologias avançadas e de uma
legislação internacional mais dura e eficiente.
Que fique bem claro: jamais renunciaremos
à defesa intransigente da liberdade de expressão, mas defenderemos até o fim o
livre acesso à informação de qualidade, sem mentiras e manipulações que levam
ao ódio e à violência política.
Nossa missão é fortalecer a democracia –
entre nós, no Brasil, e em nossas relações multilaterais.
A importância do Brasil neste cenário
global é inegável, e foi por esta razão que os olhos do mundo se voltaram para
o nosso processo eleitoral.
Precisamos de instituições fortes e
representativas. Precisamos de harmonia entre os Poderes, com um eficiente
sistema de pesos e contrapesos que iniba aventuras autoritárias.
Precisamos de coragem.
É necessário tirar uma lição deste
período recente em nosso país e dos abusos cometidos no processo eleitoral.
Para nunca mais esquecermos. Para que nunca mais aconteça.
Democracia, por definição, é o governo do
povo, por meio da eleição de seus representantes. Mas precisamos ir além dos
dicionários. O povo quer mais do que simplesmente eleger seus representantes, o
povo quer participação ativa nas decisões de governo.
É preciso entender que democracia é muito
mais do que o direito de se manifestar livremente contra a fome, o desemprego,
a falta de saúde, educação, segurança, moradia. Democracia é ter alimentação de
qualidade, é ter emprego, saúde, educação, segurança, moradia.
Quanto maior a participação popular,
maior o entendimento da necessidade de defender a democracia daqueles que se
valem dela como atalho para chegar ao poder e instaurar o autoritarismo.
A democracia só tem sentido, e será
defendida pelo povo, na medida em que promover, de fato, a igualdade de
direitos e oportunidades para todos e todas, independentemente de classe
social, cor, crença religiosa ou orientação sexual.
É com o compromisso de construir um
verdadeiro Estado democrático, garantir a normalidade institucional e lutar
contra todas as formas de injustiça, que recebo pela terceira vez este diploma
de presidente eleito do Brasil – em nome da liberdade, da dignidade e da
felicidade do povo brasileiro.
Muito obrigado.
Luiz Inácio Lula da Silva
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