Um ex-sem-teto e motoboy se tornou exemplo de determinação em Fortaleza. Sérgio Chaves Pereira, 36 anos, voltou a estudar após 20 anos longe da sala de aula e, em 2022, recebeu a notícia da conquista: a aprovação no exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Antes da aprovação, Sérgio passou
frio e fome pelas ruas, sofreu preconceito de colegas de turma na faculdade e
conciliou dois empregos com os estudos.
A vida de
Sérgio Chaves sempre foi difícil. Aos 12 anos, viajou por conta própria para
Teresina, no Piauí, sem chance de estudar ou trabalhar. "Quando eu tinha
de 11 para 12 anos, fui parar em Teresina. Por ainda ser uma criança e sem
oportunidades, acabei tendo que morar nas ruas daquela capital", lembra.
Por
meses, ele dormiu nas calçadas e comia frutas estragadas da Ceasa de Teresina.
Nessa época, passou frio e ganhava algumas moedas de donos de carros que
vigiava.
"Para
sobreviver, eu comia frutas estragadas no Ceasa. Pastorava carros em troca de
algumas moedas, lavava louças de um pequeno box na rodoviária. Às vezes, por
sorte, comia sopa em um local que fornecia esse alimento gratuito para pessoas
que estavam na mesma situação que eu e, às vezes, comia resto de comida do
lixo."
"Dormia
nas calçadas, meu lençol eram caixas de papelão e meu travesseiro era minhas
sandálias. Às vezes, quando os seguranças da rodoviária não me viam, conseguia
dormir ali dentro. Passei frio, passei fome e fiquei nessa situação, por
aproximadamente um ano", acrescenta.
Primeiro emprego e volta aos estudos
Em 2002, Sérgio Chaves viajou para Fortaleza. Na capital cearense, foi acolhido por Raimundo Nascimento, proprietário de um lava a jato no Bairro de Fátima, que o tirou das ruas e deu o primeiro trabalho. "Nonato me tirou das ruas e me deu um trabalho, um teto, comida, uma renda fixa por semana", relata.
Alguns meses depois, Nonato e a família
foram para Juazeiro do Norte, no Cariri. Sérgio Chaves ficou responsável pelo
lava a jato. Além de trabalhar no local, ele conseguiu uma bicicleta e começou
a entregar lanches pela noite.
"Tempos
depois, à noite, comecei a fazer entregas de lanches usando como transporte uma
bicicleta e durante o dia lavava carros. Os novos donos do lava a jato
resolveram trocar os antigos funcionários e foi então que aluguei um pequeno
quarto e passei a fazer entregas também durante o dia. Com a ajuda de um amigo,
comprei uma moto e passei a fazer entregas usando esse veículo."
Alguns meses depois, Nonato e a
família foram para Juazeiro do Norte, no Cariri. Sérgio Chaves ficou
responsável pelo lava a jato. Além de trabalhar no local, ele conseguiu uma
bicicleta e começou a entregar lanches pela noite.
"Tempos
depois, à noite, comecei a fazer entregas de lanches usando como transporte uma
bicicleta e durante o dia lavava carros. Os novos donos do lava a jato
resolveram trocar os antigos funcionários e foi então que aluguei um pequeno
quarto e passei a fazer entregas também durante o dia. Com a ajuda de um amigo,
comprei uma moto e passei a fazer entregas usando esse veículo."
Depois de 20 anos, Sérgio Chaves
decidiu voltar a estudar. Ele tinha o sonho de cursar direito. Em 2017, o
motoboy trabalhava em dois lugares, em dois turnos. Ele fez o Exame Nacional
para Certificação de Competência para Jovens e Adultos e conseguiu o
certificado de conclusão do ensino médio para poder prestar vestibular.
"Voltei aos estudos em 2017, depois de 20 anos que havia parado na 3ª série do ensino fundamental. Voltei na 4ª e 5ª, na época. Eu trabalhava em dois lugares, dia e noite. Então deixei o emprego da noite para estudar. No decorrer daquele ano, também fiz o Encceja. O resultado saiu em fevereiro de 2018 e fui aprovado.
Então corri para pegar o certificado de conclusão do ensino médio. Fiz o
vestibular em uma instituição particular e comecei o curso de direito",
afirma, entusiasmado.
Preconceito e dificuldade nos
estudos
Os primeiros semestres no curso
de direito foram difíceis para Sérgio Chaves. A falta de base do ensino regular
o prejudicou muito. "Tive bastante dificuldades. Certa vez fui corrigido
por um colega de sala, em um grupo de aplicativo da turma: 'essa palavra não se
escreve assim'. E por várias vezes isso se repetiu, foi então que percebi que
além de estudar as disciplinas regulares do curso, que eram oito ou nove por
semestre, também tive que estudar português."
Durante o
curso, Sérgio Chaves teve que enfrentar preconceitos dos colegas de turma. Pelo
fato de cometer alguns erros de português, alguns alunos investigaram se ele
tinha passagens pela polícia.
"Também me recordo que uma
das primeiras coisas que alguns dos colegas de sala fizeram foi puxar minha
ficha criminal, tomei conhecimento disso muito tempo depois, ocasião em que um
desses colegas militares me falou: 'Cara, você provou para todos nós que estávamos
errados ao seu respeito, uma vez puxamos sua fixa corrida'. Hoje, todos são
meus amigos. A prova disso é que fui escolhido como paraninfo da turma",
recorda.
Estudo em moto e matéria na
parede do banheiro
Para ter sucesso nos estudos, o
motoboy fez um plano didático. Se afastou das redes sociais, chegava mais cedo
no trabalho para estudar e ouvia aulas gratuitas no YouTube. Até colocar
adesivos com anotações no guidom da moto e conteúdo acadêmico na parede do
banheiro foi arquitetado por Sérgio Chaves. Tudo isso para fixar o aprendizado.
"Com isso, quando eu parava
em um semáforo, dava uma revisada. Quando eu aprendia aquele assunto, trocava
os post it. Também tinha coisas escritas em locais estratégicos de casa, como
na parede da pia do banheiro. Todos os dias eu tinha que olhar para aquela
parede e lia o que estava escrito."
A
dedicação levou Sérgio Chaves ao ser aprovado, na primeira tentativa, no exame
da Ordem da OAB. Ele cursa o 9º semestre e ainda trabalha fazendo entregas
pelas ruas de Fortaleza. Aos sábados e domingos faz estágio em um escritório de
advocacia.
Fonte: https://g1.globo.com/ce/ceara/educacao/noticia/2022/12/20/apos-passar-fome-e-frio-ex-sem-teto-concilia-trabalho-de-motoboy-e-graduacao-em-direito.ghtml.
Acesso em 20/12/2022.
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