Na última segunda-feira (06/09), tive a
oportunidade de reviver uma prática agrícola de minha adolescência e juventude,
a “BAITA DE FEIJÃO”, uma tradição que ainda encontra nos agricultores
familiares formas originais e aspectos de resistência simbólica, desafinado ao
passar dos tempos, tanto o tempo cronológico, como o tempo histórico. A citada
“baita de feijão", aconteceu na localidade de Queimadas, município de
Governador Mangabeira, da qual sou natural.
A “baita de feijão” foi uma inciativa
da minha irmã Cleuza Borges, com apoio do amigo Vardilon Alves, da prima Jusiara
da Silva (Sarinha), da cunhada Vanderlea Bastos (Lea) e da minha esposa Miriam Flores, não
deixando de mencionar o olhar de curiosidade da sobrinha Luzia Borges, com seis
anos de idade, querendo saber como tudo acontecia, uma possiblidade de que a
tradição irá continuar.
Tal atividade aconteceu na antiga
residência do meu saudoso tio Rosalvo Borges, ao lado da casa dos meus pais
Estevam Borges da Silva e Maria Medeiros da Silva (ambos In Memorian) na localidade
de Queimadas, casa que hoje é habitada por meu irmão João Carlos Borges da
Silva (Cacau Borges),
Uma vez caracterizada a citada “baita
de feijão” no campo geográfico e no sentido familiar, tentarei descrever um
pouco em que consiste essa significativa prática agrícola.
Após a colheita do feijão entre os
meses de julho e agosto, a vagens são colocadas para secar diariamente no
terreiro da casa do agricultor, até chegar à condição para que se possa “bater”
e os caroços sejam retirados da palha através do ato da “baita”. Nesses dias
existe uma forte torcida para que não chova, ao contrário será aquela correria
para pegar o feijão antes que a chuva chegue (risos...).
A “baita do feijão” é caracterizada da
seguinte forma: uma vez o feijão seco, em um dia ensolarado, coloca-se uma
quantidade das vagens no meio do terreiro (no meu caso foi dentro de uma sala),
então com um pedaço de pau (conhecido como porrete), preparado para essa
finalidade, as pessoas emitem várias pauladas até que o grão possa se
desprender da palha, movimentando essas palhas com os pés e revirando-as com o
próprio porrete quantas vezes sejam necessárias.
Efetuada a “batida do feijão”,
o próximo passo é “BIATAR” os grãos, que consiste em retirar restos das palhas
que ficaram durante o processo das batidas, para tanto o agricultor vai
precisar do vento a seu favor, pois uma pessoa eleva com os braços em uma
posição acima da cabeça, uma vasilha cheia dos caroços e vai derramando
lentamente os grãos em outra vasilha para que o vento possa retirar as palhas
que restam. Esse movimento é repetido por várias vezes até que toda quantidade
de feijão fique limpa para o devido consumo humano.
Ao passo que o feijão vai sendo
“biatado”, outra pessoa vai medindo a quantidade dos grãos limpos. Essa medição
na região do Recôncavo baiano, ainda é realizada por muitos agricultores, utilizando
uma medida chamada de “quarta”, que corresponde a 20 litros ou aproximadamente
a 15 KG, assim 4 quartas correspondem a um saco, quantidade alcançada na
“baita” que participei na localidade de Queimadas (risos...), ressaltando que esse tipo de
medida no passado era a mais utilizada, muito em função das dificuldades do
lavrador em adquiri uma balança, visto que o preço desse objeto era elevado.
Assim, a alternativa era a utilização da “quarta”, confeccionada com uma tábua,
em forma de um quadrado com aproximadamente 30 centímetros de profundidade.
Também, é oportuno citar, que ainda em
vários lugares a “baita do feijão” é realizada através da coletividade
familiar, ou seja, uma família ajudando a outra, configurando o famoso
adjutório (também conhecido como “djitório”), acompanhado de muita bebia e
comida, que ficam sob a responsabilidade da família que o feijão será batido
naquele determinado dia. Na maioria das vezes as batidas nas vagens do feijão
são realizadas por homens, já a “biatagem” por mulheres (não foi o caso de
Queimadas, que teve igualdade de gênero, nas duas ações, risos...). Assim, essa
prática da agricultura familiar, torna-se um momento de alegria e até de diversão,
com muita cantoria, através de músicas que expressam o cotidiano dessas
pessoas.
Evidente, que a “baita de feijão”,
também, ao longo dos anos vem sofrendo as influências dos avanços tecnológicos,
sendo sua prática substituída pelo uso das máquinas, contribuindo para o seu
enfraquecimento em várias regiões do país, porém há quem ainda resistia a esses
avanços, como foi o nosso caso lá em Queimadas, mesmo que seja um ato provocado
pela dimensão da memória coletiva, que nos possibilita um contato com a nossa
reminiscência, revivendo com suas devidas ressignificações aspectos da nossa
história familiar e comunitária.
Por fim, devo demonstrar toda minha
alegria e felicidade em participar dessa “baita de feijão” na comunidade de
Queimadas, revivendo aspectos interessantes da minha história de vida, também
agradecer as pessoas (Cleuza, Vardilon, Jusiara, Vanderlea e Mriam) que, também participaram dessa gostosa e interessante atividade.
Por: Luís Carlos Borges da Silva (Professor Borges).
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